25out2017
25out2017
Resenha: A Inconfundível Escrita de Murakami #OutubroRosa #LivroRosa
Por João Moreno
“(…) Mas acho que, se
for pra escrever, melhor que seja, no mínimo, alguma coisa edificante pra você
mesmo. Senão não faz sentido. Não é?” (MURAKAMI, 2016, p. 103).
Quando,
lendo um livro de Murakami, perguntam-me: “sobre o que se trata esse livro?”,
demoro muito à responder. O pior: depois de muito pensar, à resposta que chega
aos meus ouvidos não agrada-me em nada. Para mim, desde Minha Querida Sputinik, meu primeiro livro, sempre foi difícil
caracterizar a temática de suas obras. Pergunto-me, seria essa uma exclusividade
minha?
Haruki
Murakami, parte da atual leva de escritores contemporâneos da literatura
japonesa, é dono de uma “voz particular, única na língua japonesa”, segundo o
próprio autor. Para o livro 501 Grandes Escritores, trata-se de uma voz de difícil caracterização, que define-se em sua “prosa coloquial, com pendor para o bizarro (…) e
tendências diversas quanto ao Realismo Mágico e Ciberpunk”. (PATRICK, 2009, p. 608).
“Naquela
época, eu acreditava sinceramente que, convertendo tudo em números desse jeito,
conseguiria comunicar alguma coisa às outras pessoas. E que ter algo pra
comunicar seria uma prova definitiva da minha existência”. (MURAKAMI, 2016, p. 85).
Ainda sobre esse estilo de escrita (que bebe no surrealismo), talvez às obras
se pautem realmente no absurdo que mesclam-se às indissociáveis metáforas.
Metáforas essas, nas palavras do próprio Murakami, dotada de ritmo próprio e
construídas em características únicas.
“Às vezes o dia de ontem parecia o ano
anterior, ou o ano anterior se confundia com o dia de ontem. Nas horas mais
graves, o ano seguinte se confundia com o dia anterior (…) Por muitos meses,
por muitos anos, permaneci assim, sentado sozinho no fundo de uma piscina
profunda. A água morna, a luz suave, o silêncio. O silêncio… (MURAKAMI, 2016, p..154).
Ainda
sobre esse estilo (e, aqui, a repetição se faz necessária), Stephen Yeager,
Doutor em Literatura Inglesa, complementa, “fica sempre a impressão de que o
que está ausente não foi perdido – na verdade, nunca se apresentou”.
“(…) traçava novamente seu caminho, retornado
ao seu próprio mundo. Nesse caminho de volta, uma tristeza nebulosa sempre
invadia seu peito. Aquele mundo que esperava seu retorno era vasto demais,
poderoso demais, e ali ele não encontrava nenhum lugar para se refugiar.” (MURAKAMI,
2016, p. 170).
Ouça a
Canção do Vento e Pinball, 1973, duas novelas que compõem os primeiros escritos
de Murakami, duas narrativas intercaladas que se confundem e nos confundem.
Talvez, nessas duas obras, não haja uma temática protagonista. O cotidiano
assume tons, a incerteza do futuro dita ritmos, a nostalgia, principalmente
ela, assume formas.
“Um belo dia nosso coração se prende em alguma
coisa. (…) Por dois ou três dias fica perambulando pelo nosso coração, depois
volta pra escuridão de onde surgiu. Há poços profundos escavados nos nossos
peitos. Pássaros cruzam o ar sobre eles”. (MURAKAMI, 2016, p. 210).
E a
solidão permanece como marca indelével de suas linhas. “Você não se sente
sozinho, mesmo? – perguntou ela, mais uma vez, no fim. Enquanto eu procurava
uma boa resposta, o trem chegou”. (MURAKAMI, 2016, p. 209). E tão difícil
quanto caracterizar as obras de Murakami, comentá-las tornou-se atitude
ingrata. Escrever sobre o que foi lido é como tentar agarrar com mãos enluvadas
a brisa que sopra num longínquo verão. Ou tentar descrever as sensações
trazidas pelo acariciar do vento numa tarde distante.
A
sensação que fica é a do toque das palavras. Da certeza que ali, em alguns
(muitos) momentos, sensações foram despertas. E, na tentativa de atentar-se
para estas, sobra-me, apenas, um vazio. O escape das palavras na memória.
Palavras, seus significantes e significados. Fica, também, à sensação de
enxergar-me em seus personagens, suas contradições e dilemas. “(…) Diversos
perfumes passaram suavemente pelo seu nariz e desapareceram. Foram muitos
sonhos, muitas tristezas, muitas promessas. No fim, tudo desaparece”. (MURAKAMI,
2016, p. 189).
E, não
importa quão marcante tenham sido à passagem de pessoas em nossas vidas, no
final, ela, a vida, sempre segue. E como diria o próprio Murakami, na primeira
linha de Ouça a canção do Vento. “Não existe nenhum texto perfeito. Assim como
não existe desespero perfeito”. (MURAKAMI, 2016, p. 21). É a sensação que fica
ao tentar narrar o inenarrável, transcrever o ‘intranscrevível”. Sentimentos esses, para mim, ligados de maneira
inconfundível às obras de Murakami.
“Vendo de longe (…) qualquer coisa fica
bonita”. (MURAKAMI, 2016, p. 208).
Referências
MURAKAMI, Haruki. Ouça a canção do Vento; Pinbal, 1973, 1ª ed.
Rio de Janeiro: Alfaguara, 2016.
PATRICK, Julian (Ed.). 501 grandes escritores. Rio de
Janeiro: Sextante, 2009.
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Trinta e sete minutos para tirar essa foto. Percebe-se que nunca trabalharei com Fotojornalismo. Arquivo Pessoal. |
4 comentários
Nossa, sua resenha me deu até vontade de chorar! Tá afim de fazer meus trabalhos de faculdade não?! tá ótema!!! Parabéns!
ResponderExcluirNunca li o livro, mas já o vi algumas vezes.
Parabéns novamente pela resenha.
Beijinhos!!
#Ana Souza
https://literakaos.wordpress.com
Ana Souza, tudo bem por aí? Meu contato com o Murakami ainda é superficial, mas tenho a sensação de que ele já é um dos meus autores preferidos de todos os tempos. E, realmente, é muito difícil explicar o que são suas obras, da mesma maneira que tentar explicar o que é Cem Anos de Solidão, por exemplo.
ExcluirSobre 'assessoria acadêmica', eu sei que foi uma piada, mas se estiver precisando: sacocheioassessoriaacademica@outlook.com - É sério, temos até uma página no Facebook. Dê uma olhadinha, conte para sua família e seus amigos universitários. Agora vou lá, tenho um TCC de uma pessoa para 'assessorar'.
P.S.: E finalmente um comentário! O feedback de vocês, leitores, é muito bacana. Só resta torcer para que venha mais vezes, se quiser, aos domingos, onde escrevo, de vez em quando, (estou em falta à três semanas, desculpe-me, Três Leitoras!), verdades absolutas de lugar nenhum.
ola, tudo bem?
ResponderExcluirAinda não tinha ouvido falar de Murakami. Achei muito curioso o fato de que ele tem uma escrita única. Que não encaixa em algo específico, mas tem um pouco aqui e acolá.
E, não sei qual elogio: os quotes ou tua resenha! Tão poéticamente escrita! Amei! Parabéns! Peninha que o livro não é meu tipo!
bjs
Oi Gisele! Super obrigada pela sua visita!
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